9 de jul. de 2011

Naquela serra de Carlos Araújo - publicado na edição nº 0

Em cima daquela serra
Tem o meu rastro na terra
Nas ramas de melancia
Ali nasceu minha infância
Nutrida na abundância
Das ramas de poesia.

Naquela serra, eu garanto,
Tem mais beleza e encanto
Do que dizem certas loas
E quem vai só de passagem
Perde o melhor da viagem
Pois não vê as coisas boas.

Bem lá em cima, é verdade,
Tem muitos pés de saudade
Crescidos na capoeira
E meu ouvido menino
Guarda o canto genuíno
Do xexéu de bananeira.


Ainda quase bruguelo
Eu escutava o duelo
Entre casacas-de-couro
Era uma peleja dura
Mas escrita em partitura
Com uma clave de ouro.



Nas noites cheias de lua
Não se via lá na rua
O que na serra se via
Pois a lua, bem ligeiro,
Erguia em cada terreiro
Um templo de cantoria.


Lá na serra onde nasci
Não dá pra dizer aqui
Tudo quanto vi por lá
Mas sinto ainda o deleite
De cada dente de leite
Mastigando jatobá.


E a resina de anjico
Só de falar eu já fico
Sentindo gosto no nome
Aquele bem precioso
Era um jeito saboroso
De enganar minha fome.


Grudada em minha retina
Uma imagem cristalina
Revela um tal vaivém
De um bode no chiqueiro
Feito um sultão verdadeiro
Controlando seu harém.


E a meninada exibia
Sua tecnologia
Rudimentar sem segredos
Para sua diversão
Com muita imaginação
Fazia os próprios brinquedos.


E o chicote queimado
Era um brinquedo animado
Aquecendo o coração
- Está frio ou está quente?
A resposta era a semente
De uma nova emoção.


Quem vê a serra distante
Feito um livro na estante
Que não se abre pra ler
É como uma fantasia
É mulher que se assedia
Mas que não se pode ter.


Quem por lá aparecer
Demorar e conhecer
Rapidamente conclui
Que teve um tempo perdido
E chora por não ter sido
O menino que eu fui.

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